cem anos de solidao

Há meses que este livrinho me provocava da prateleira, rindo pra mim com seu arrogante subtítulo “Ganhador do Prêmio Nobel de Literatura”. Sempre tenho muito receio sobre ganhadores de prêmio, títulos rebuscados ou certificações que traduzem que o indivíduo/objeto é muito mais especial ou tem algo de muito bom que o faz merecedor do título. Em fim, segurei-o entre as mãos, encarei-o e desafiei: “Vamos lá, me mostre que você fez por merecer esse Nobel!”. Abri a capa e dei uma espiada na orelha, movido pela curiosidade que me corroia (em geral não leio as orelhas antes de terminar o livro, pois há imbecis que escrevem o final ali). Dizia “O colombiano Gabriel Garcia Marquez (1928) é o último grande contador de histórias do século XX – e, até prova em contrario, da própria literatura ocidental.”

Fechei-o e o encarei novamente dizendo: “É uma afirmação e tanto. Você tem certeza que quer mesmo continuar com isso?”. E o livro respondeu com ar de tranqüilidade: “Ora, vamos! Leia-me e tire suas conclusões.”

cem anos de solidao

E assim o fiz. Segui o início do romance um pouco incomodado. Tudo era muito trivial, muito simples. O estilo era agradável, mas o enredo entediante. Durante os primeiros dias afirmava, zombei dele dizendo “se foi você quem ganhou o prêmio Nobel, imagino que miseráveis não eram os outros concorrentes!”

E repentinamente a coisa mudou de rumo. Silenciosamente a tempestade armou-se e desabou num só golpe. E eu, em pé no ônibus, alheio a todo murmúrio e ao cheiro acre e fétido do ambiente fechado, sentia-me humilhado e de joelhos, enquanto meu espírito elevava-se, carregado pela genialidade da obra.

As notas da tradutora indicam que a tradução foi feita junto ao autor, o que para mim é uma tranquilidade imensa, pois sabe-se que fora feito o melhor possível na tentativa de transmitir as idéias e sentimentos tais quais no original.

O nomes dos personagens exigem uma atenção redobrada, considerando que os bisnetos tem nomes dos avós, que tem nomes dos pais e assim por diante. Mas isso é só mais uma amostra do poder de manipulação do autor para com o leitor.

Senti-me como um pequeno verme. Envergonhado pelos pré-julgamentos infantis e ignorantes. Exacerbado pela emoção, quase em prantos, pedi perdão ao livro e lhe disse que lho daria tantos prêmios Nobels quantos pudesse. E ele solenemente me perdoou. E então me ofereceu um dos mais perfeitos e majestosos finais que já li e uma lição sobre arrogância.

O Sr. Gabriel Garcia Marquez é agora membro integrante da APLD (Academia Particular de Letras do Douglas). E situa-se dignamente ao lado de vários outros gênios, entre eles os senhores Miguel Cervantes, Machado de Assis e Fiodor Dostoievsky.

Sem mais.

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3 Replies to “Cem Anos de Solidão”

  1. Agora tu tá no meu RSS do google. Leio esse grog todo dia.

    Feliz aniversário atrazado. Que Deus e teus filhos terminem de te criar.

    Socio

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