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A Sangue Frio
Truman Capote

Há livros ótimos, que nos encantam pela técnica e pela profundidade. Pela beleza ou até pela feiura das palavras. Eu citaria aqui Grande sertão: veredas, que odiei nas primeiras 70 páginas, mas que, passado o trauma inicial, tornou-se um dos meus “10 livros para ler na sua vida”.

Assim como há aqueles livros que esquecemos uma vez finda a última página, que não agregam em nada, independente da leitura ser ruim ou boa. Literatura fácil, de entretenimento, que não é necessariamente uma perda total de tempo, mas que não me apeteceria voltar nela. Algo como Nicholas Sparks ou Paulo Coelho (me perdoem aqui tanto os amantes quanto os odiadores de ambos, mas pra mim… São apenas “tanto faz”).

Há, todavia, aquele tipo de literatura que muda sua vida. Que dá uma chacoalhada em você e te faz ficar puto, emocionado e estarrecido. Pensando “como este filho da mãe fez isso?”. O livro A Sangue Frio, de Truman Capote, é desse tipo.

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Conhecido pela enorme prepotência em total contraste com suas poucas medidas, Capote era tão impertinente em relação a sua carreira e à sociedade literária do seu tempo que se dignou a criar um gênero literário próprio.

Um belo dia, folheando as páginas da revista The New Yorker, chamou a atenção de Capote uma nota sobre um terrível assassinato numa cidadezinha do interior do Kansas, onde quatro membros de uma família foram brutalmente mortos.

Ele rumou para lá e deu início à empreitada que o levaria ao hall dos imortais da literatura. A obra tem tanto uma verve jornalística quanto uma coloração de romance. Dicotomia que justifica a afirmação de que é um gênero à parte: o romance não-ficção.

A família Clutter vivia uma espécie de utopia do American way of life, o modo de vida americano, onde vangloria-se da mesmice, dos costumes bucólicos e da religiosidade resignada. Eram cidadãos modelos em sua comunidade. E, numa noite fatídica, são amarrados e mortos com tiros de espingarda na cabeça.

Os assassinos são conhecidos desde o início da narrativa – Perry Smith e Dick Hikcock. Capote explora suas vidas até os ossos. Suas motivações existenciais, seus traumas, medos e fantasias. O leitor se afeiçoa a eles tanto quanto às pessoas da família que serão suas vítimas e depois é posto contra a parede, tendo de optar por uma sentença (sim, o leitor). Capote é imparcial. Usa a terceira pessoa, fazendo de conta que explora a narrativa como jornalista, exibe os fatos sem julgar, mas abusa de seu talento de romancista e inclina-se de um lado a outro na balança da justiça, tecendo uma teia de sentimentos e dramas sem, contudo, expor opiniões. Recua e deixa que você julgue.

truman-capoteO livro é muito articulado. Mostra fatos e cenas que parecem, aos olhos do leitor impaciente, meramente encheção de linguiça, mas depois se encaixam na intrincada e maravilhosa trama digna de uma novela noir. Apesar de ser baseada numa história real, o mérito é todo do baixinho, pois é dele a engenhosidade de costurar os retalhos e compor a obra.

O ponto de vista narrativo varia entre vítimas, assassinos e policiais, mais ou menos nesta ordem, ficando mais intensos nuns ou noutros, de acordo com o decorrer da história. Ele relata o conteúdo de entrevistas, sempre mantendo, entretanto, o narrador distante. Porém, em minha opinião, ele dá muito mais atenção a um dos assassinos em específico. Há boatos, inclusive, de que se apaixonara pelo rapaz.

O prefácio da edição que peguei é escrito pelo jornalista Ivan Lessa. Elogios rasgados que alavancam promessas comprometedoras sobre a obra. Felizmente, cumpriram-se todas, pois passei a corroborar com elas.

Própria para ler degustando um café vienense.
[rating=5]

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