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»» versão do artigo “How to Not Waste Your Words: The Secret to Writing a Crappy but Usable First Draft”, escrito por Jeff Goins, publicado em 19/12/2016 no Goins, Writer ««

O segredo de escrever um primeiro rascunho porcaria, mas utilizável

“Muito poucos escritores realmente sabem o que estão fazendo, até terem terminado.”
– Anne Lamott

Ok. Vamos abrir o jogo: seu primeiro rascunho de qualquer coisa será ruim – quer dizer, muito ruim. Porque essa é a função do primeiro rascunho. Ser ruim. E sua função é escrevê-lo.

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Depois que você escreveu seu terrível primeiro rascunho, você pode escrever outro melhor, e um terceiro mais elegante, e assim por diante. Mas você tem de começar de alguma forma. Como a escritora Anne Lamott diz: “Quase toda boa escrita começa com terríveis esforços iniciais.”

Temos essa crença de que escritores muito bons não têm de fazer isso, de que eles são, de alguma forma, imunes a essas tentativas e adversidades ao enfrentar “terríveis esforços iniciais”.

Isso não é verdade.

Todo grande escritor começa no mesmo lugar: na terra da insegurança e do autoquestionamento. Eles ficam tão assustados e apreensivos quanto você. Mas há um truque que os pros conhecem e que o resto de nós pode pegar emprestado.

Já que começamos todos no mesmo lugar, o segredo para escrever melhor é fazer logo o primeiro rascunho porcaria. E é exatamente o que eles fazem.

O primeiro rascunho ruim, mas utilizável

Muitos escritores ficam empacados no meio de seu primeiro rascunho, que é como ir acampar e montar sua barraca do lado de um penhasco em vez de escalar até um terreno plano. Parece mais fácil parar agora e descansar do que pensar a respeito, mas a opção mais segura realmente é continuar avançando.

Sim, é difícil. Sim, você ficará assustado. E, sim, a tarefa pode parecer tão esmagadora que você vai querer desistir. Eu gostaria de te dizer que essa sensação vai embora, mas desde quando comecei a escrever, ela não vai.

O que acontece, no entanto, é que você aprende a confiar nessa sensação. Ela indica que você está indo na direção certa. enfrentando seu medo e afastando a Resistência.

Seu objetivo, a qualquer momento que você sentar para escrever, nunca deveria ser escrever algo bom. Deveria sempre ser escrever algo utilizável. Falei isso antes e vou falar de novo: é melhor ser um escritor eficiente do que um bom escritor.

Ser bom é subjetivo. A definição de ser “bom”, especialmente no sentido literário, muda com o tempo e os gostos. Mas se você aprende como se comunicar efetivamente com o público, qualquer público, você sempre terá trabalho.

Seu objetivo é escrever um primeiro rascunho ruim, mas utilizável. Há duas maneiras de fazer isso.

Método #1: Improvisando

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A primeira abordagem é simplesmente escrever o que você sentir, despejar palavras numa mágina e esperar pelo melhor. Em seu livro Sobre a escrita, Stephen King chama isso de “pantsing” porque você está “flying by the seat of your pants” (N.T.: expressão idiomática que, ao pé da letra, significa pilotar uma aeronave sem plano de voo e, figurativamente, fazer as coisas sem planejamento, ao acaso).

Você pode escrever desse jeito. Atualmente, eu estou escrevendo um livro dessa forma, então seria desonesto dizer que não funciona. Mas tenho de dizer que você provavelmente vai perder muitas palavras escrevendo desse modo.

Por quê?

Porque você começará indo numa direção e perceberá ao longo do caminho que deveria ter ido para outro lado.

Você irá despejar ideias e esperar que elas se juntem. Então, elas encontraão seu lugar e você verá uma linha de pensamento, e a reescrita começará. Essa abordagem é um pouco desastrada, mas é às vezes necessária.

Se puder evitá-la, faça-o. Se não, supere-a.

Método #2: Planejando

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Escaleta de J.K. Rowling para Harry Potter e a Ordem da Fênix (fonte: http://annagain.com/)

O segundo jeito de escrever um primeiro rascunho ruim, mas utilizável é planejá-lo um pouco mais. Não estou dizendo para você estruturar antecipadamente todas as suas 64 cenas, se bem que alguns argumentem que deve ser feito. Estou sugerindo que você sente-se e se faça algumas perguntas básicas. Porque, no final, escrever é simplesmente responder perguntas.

O que acontece quando três solteirões são obrigados a criar uma criança? O que faremos sobre o aquecimento global? E se o mundo em que achamos que vivemos fosse na verdade governado por máquinas?

Toda boa escrita, seja ficção ou não-ficção, responde perguntas. Então faz sentido que comecemos com uma série de perguntas.


Seja qual for o método que escolher, você irá querer se fazer algumas perguntas. Com o Método 1, vai acontececendo à medida que você escreve. Com o Método 2, você fará isso antes de escrever.

Independente, vocè vai querer responder a estas questões antes de terminar seu primeiro rascunho, se você quiser ter algo ruim mas utilizável:

Pergunta 1: Do que se trata? (Tema)

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Você precisa de um tema. Aprendi isso com minha amiga Marion, quando ela escreveu “Todo grande livro de memórias é sobre algo e esse algo não sou eu”. Isso se aplica a todos os tipos de escrita.

Ótima escrita é sobre algo e esse algo não é você.

Então você precisa de um tema, um panorama. Talvez seja justiça ou verdade. Talvez seja esperança em meio a luta e dor. Mas você precisa escrever sobre algo maior do que você mesmo. É por isso que fuçamos em romances abertos, vasculhamos a seção de auto-ajuda e vamos ao cinema na sexta à noite.

Estamos sempre procurando conexão com uma verdade maior que nós, algo que nos ajude a dar sentido a nossas vidas. Nenhum gênero está livre dessa função. Até o humor nos ajuda a ver que a vida vale a pena ser vivida.

Para começar, faça uma lista de temas. Nota: ideias positivas costumam se conectar melhor que as negativas. É algo que Marion me ensinou (você deveria mesmo ler o livro dela, The Memoir Project). Então, em vez de escrever sobre a dor de crescer em um ambiente abusivo, escreva sobre o poder do perdão ou da perseverança.

Lembre-se: a escrita precisa ser sobre algo, e esse algo não é você.

Pergunta 2: O que estou tentando dizer? (Argumento)

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Você precisa ter um argumento, um assunto, uma razão para dizer isso tudo. De novo, isso se aplica tanto para ficção quanto para não-ficção. Mesmo se o argumento for um clichê tipo “o amor vence tudo” ou “você recebe o que merece”.

Todas as grandes histórias, desde Romeu e Julieta até Breaking Bad, tem argumentos. E claro, assim como toda peça de escrita persuasiva, memória ou dica de negócios.

Seu argumento deve ser uma declaração simples que caiba numa ficha que você possa carregar consigo ou grudar em seu computador. Precisa ter uma frase e ser fácil de lembrar. É nisso que você irá basear toda e qualquer decisão de escrita.

Antes de decidir seu argumento, vamos ser diretos. Você não precisa estar certo. Você não precisa ter 100% de certeza de que isso é verdade. O que você tem de fazer, contudo, é acreditar no que está dizendo.

Não quero que você minta descaradamente, claro, mas frequentemente mudamos de ideia sobre o que achamos sobre a verdade e a natureza do universo, ou mesmo o que consideramos engraçado. Então, só porque algum dia você pode não acreditar nisso não é um motivo bom o bastante para não escrever sobre isso hoje.

Como um bom amigo recentemente me falou:
“Não precisa estar certo; basta ser interessante.”

A função de um argumento é fazer seu leitor pensar.

Pergunta 3: Para quem é? (Público)

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Toda escrita precisa de público. O escritor esperto identifica para quem está escrevendo antes de começar.

Talvez seja uma questão de estilo: “Este é um livro para leitores da ficção científica de Michael Crichton”. Talvez seja uma questão de necessidade: “Este é um livro para quem quer entender os prós e contras da água encanada”. Ou ainda, uma questão de empatia: “Este é um ensaio para aqueles que se esforçam para estar presentes na vida dos filhos”.

Independente de como você responder a essa questão, você deve fazê-lo. Mesmo que você não tenha um público ainda, você tem de identificar para quem escrever. Você deve imaginá-los enquanto escreve cada palavra, vendo-os com os olhos da mente, tentando persuadi-los, entretê-los ou inspirá-los.

Todos os bons escritores fazem isso, seja instintivamente ou por prática.

Escrever envolve comunicação, e sem alguém para receber a mensagem, você não fez seu trabalho direito.

Resumindo

Então, aí está seu curso intensivo para escrever um primeiro rascunho ruim mas utilizável. Pegue um caderno e uma caneta e anote essas três perguntas, passe cinco minutos respondendo-as e então comece a escrever.

Acho que você ficará surpreso com a rapidez com que a escrita flui e o quão aproveitável é o conteúdo.

Mas lembre-se: vai continuar sendo ruim. Ruim, mas usável.

É isso que temos de fazer. Começar com um tema de uma palavra, um argumento de uma frase e uma descrição do seu público pretendido. E então começar a escrever algo muito, muito ruim. Porque essa é sua função.

o conto

Cristine Tellier
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