»» versão do artigo “How To Open Your Story: Three Dynamic Ways”, escrito por John Yeoman, publicado em 19/09/2014 no The Writer’s Village ««

“Minha vida começou no dia em que atirei no meu psiquiatra e iniciei um relacionamento ilícito com a tartaruga do bispo.”

Ainda está me acompanhando? Lógico que está. Uma história que se inicia com um mistério intrigante (vamos chamá-lo de Truque da Tartaruga), é uma história que é lida. E não temos uma segunda chance. O primeiro parágrafo é a propaganda da sua história.

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Imagine se um anunciante começa falando seu nome, o tamanho de sua empresa e a biografia de seus pais. Você compraria seu produto? Hm…

Muitas histórias são assim. O escritor “facilita nossa vida” com uma longa descrição do cenário e dos personagens. Enquanto isso, onde está a história? O motivo para lê-la? Desafio qualquer um a não ler esta história. Começa com o Truque da Tartaruga:

“Durante os anos de convivência com o Inspetor Dorj, um policial mongol, testemunhei crimes numa variedade suficiente para inspirar várias tragédias shakesperianas, mas até o anão empunhando um pé-de-cabra fez voar a fechadura da caravana circense, o inspetor nunca visto um homem morto por um defunto.” Locked In Death, de Mary Reed & Eric Mayer

Infelizmente, a história não sobrevive à sua promessa mas não ficamos sabendo disso até a página 5. A Tartaruga fez sua mágica. Tola ou não, fez seu trabalho.

Aqui estão três formas testadas, menos tolas que a tartaruga, para iniciar uma história com ímpeto – e convencer seu leitor a continuar lendo:

1. Jogue uma bomba-relógio

Toda boa história ou novela gira em torno de um evento chave. Talvez nosso personagem por acaso encontre ouro nazista ou Jane descubra que seu marido é infiel ou uma criança testemunhe algo que ela não deveria ver. Sem esse incidente não há história.

Insinue-o no primeiro capítulo ou, em um conto, logo na primeira cena. Caso contrário, do que se trata a história? Por que o leitor dele lê-la?

“Raul era um homem forte, forjado por quarenta anos nas montachas. Ainda assim, suava enquanto carregava as caixas para a caverna. A noite já tinha caído quando terminou de enterrá-las nos escombros e de limpar suas pegadas. A caverna manteria seus segredos, ele pensou. Fez por outros. Seu rosto ficou sombrio.”

Agora o pavio foi aceso. A caverna ‘manterá seus segredos’? Alguém irá revelá-los? A abertura moldou com sucesso a história por vir.

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(foto: nature.org)

2. Introduza um conflito emocional rapidamente

Uma história nos pega quando mexe emocionalmente com a gente e contém também incertezas desde o início. Suspense significa ‘incerteza’ (literalmente, ‘pendurado em dois lugares’). Inclua suspense nas primeiras 50 palavras.

“Joe nunca se atrasou antes para o jantar. Tempestade ou nevasca, você pode ajustar seu relógio por ele. Seis da tarde. A mesa posta, o frasco de ketchup no lugar, e Joe fazendo a prece. Agora são 7:10 da noite. Ela fixou a cadeira vazia e esperou o telefone tocar.”

Alguma coisa aconteceu com Joe. O quê? Aprendemos também um pouco sobre a personalidade de Joe, de passagem. Não é necessário nos contar que ele é um cavalheiro cristão, impassível, com hábitos antigos. Podemos inferir isso.

3. Encante o leitor

Se sua história não se baseia em um mistério ou conflito dramático mas, digamos, na interação delicada dos relacionamentos entre personagens, ela precisa encantar o leitor desde o parágrafo um.

“Você não pode ter um assassinato sem um corpo, pode? Não. Foi o que sempre pensei, sendo médico-legista. Mas o que médicos-legistas sabem sobre as muitas formas de morrer? Eles conhecem apenas corpos. Morrer é uma arte à parte.”

Essa abertura foi escrita por um dos meus alunos. É poética mas envolvente. O leitor conclui “este autor sabe escrever!”. E continua lendo.

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(foto: huffpost.com)

O maior erro que escritores cometem nas aberturas

Talvez o maior erro cometido por novos escritores é pegar um início potencialmente bom e enterrá-lo fundo, bem fundo na história. Em uma análise feita em mais de 5000 textos submetidos ao concurso de contos do The Writer’s Village durante cinco anos, 38% perderam pontos porque sua abertura vinha muito tarde.

“O que você fez com o corpo depois de remover as mãos?”

Essa frase intrigante, adaptada de uma abertura real, resumiu todo o enredo. Mas foi feita apenas na página 6, depois de um prólogo morno.

Que ótima abertura poderia ter sido! A história poderia seguir por um flashback, para a descoberta do corpo, a perseguição policial e a prisão do assassino. E cada um poderia repetir aquela primeira pergunta arrepiante para amarrar a história de modo satisfatório.

Lembra-se do exemplo anterior? Começava com: “Morrer é uma arte à parte”. E continuava: “Mas não era em corpos que eu estava pensando naquela luminosa manhã de primavera, em maio de 1598, mas em meu café-da-manhã. Eu tinha acabado de começar quando me assustei com uma batida forte na porta da minha farmácia. [Etc]”

O primeiro trecho é um prelúdio da história, uma reflexão. Seu significado não fica aparente por diversas páginas. Mas a palavra “morrer” se conecta com o trecho seguinte (“corpos”). A transição é suave, sem emendas.

A menos que você tenha uma abertura forte, um anúncio de sua história, ninguém vai descobrir seu produto. Prenda-nos com as primeiras palavras e talvez a gente compre a história!


John YeomanSobre o autor

Dr. John Yeoman, PhD em Escrita Criativa, é diretor do programa de escrita de ficção na Writers’ Village Academy e é tutor na Universidade do Kentucky. Tem sido um escritor comercial bem sucedido por 42 nos. Você pode encontrar um monte de ideias para escrever histórias bem sucedidas no seu curso gratuito na Writers’ Village.

Cristine Tellier
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