Do que eu falo quando eu falo de corrida
Haruki Murakami
Em 1982, Haruki Murakami decidiu vender seu bar de jazz em Tóquio para se dedicar à escrita. Nesse mesmo período, começou a correr para se manter em forma. Um ano mais tarde, ele completou, sozinho, o trajeto entre Atenas e a cidade de Maratona, na Grécia, e viu que estava no caminho certo para se tornar um corredor de longas distâncias. Neste livro, ele procura refletir sobre a influência que o esporte teve em sua vida e, sobretudo, em seu texto.
fonte: http://www.livrariacultura.com.br/
Já há algum tempo que Murakami está na minha lista de autores que “preciso ler”. Vários conhecidos que tem gosto literário similar ao meu e em cuja opinião eu confio já haviam feito comentários muito favoráveis e que me deixaram com muita vontade de ler algum de seus livros. Com o lançamento de 1Q84 essa vontade só fez aumentar. Mas tive um certo receio de me lançar e começar por uma trilogia. Do que eu falo quando eu falo de corrida me pareceu uma boa opção para conhecer o autor, já que aborda um assunto que me interessa. Ou melhor, dois assuntos: corrida e escrita. Surgiu uma oportunidade, uma brecha na fila de leitura, e li-o em menos de uma semana.
Sim, o livro fala da vivência do autor como corredor, desde sua resolução de começar a correr até a decisão de correr ao menos uma maratona por ano e de participar de triatlos. Mas não, o livro não foca apenas nisso. Murakami conta como foi seu ingresso no mundo literário, seus primeiros livros publicados e a fama adquirida depois das primeiras publicações. E relaciona seus pensamentos, dificuldades e reflexões como corredor à sua carreira de escritor. E é justamente esta a razão de valer a pena ser lido não apenas por corredores.
“Paro todo dia bem no momento em que sinto que posso escrever mais. Feito isso, o dia de trabalho seguintes transcorre surpreendentemente bem. Acho que Ernest Hemingway fazia alguma coisa parecida.”
(pag.6)“Nesse sentido, escrever romances e correr maratonas inteiras são atividades muito semelhantes. Basicamente, o escritor tem uma motivação silenciosa, interior, e não busca validação em coisas que sejam visíveis externamente.”
(pag.11)
Seria hipocrisia afirmar que não corredores desfrutam da leitura na mesma intensidade que os corredores, mas nem por isso o livro é menos interessante. Quem corre – eu, inclusive – se identifica demais com os relatos do Murakami corredor. Mas o que enriquece o livro é como ele “costura” isso ao seu dia-a-dia de escritor. Desse modo, o livro é atraente também para qualquer leitor que tenha interesse em conhecer um pouco mais do modus operandi de um escritor.
É uma autobiografia, sim. E quem leu meu post sobre Clarice, sabe que não é um gênero que me agrade. Contudo, este tem um atrativo para mim, que é o hábito de corrida de Murakami. Da mesma forma, minha vontade de ler Divórcio, de Ricardo Lísias, tem tudo a ver com o fato de o protagonista ser um corredor – assim como o próprio Lísias. Além disso, Murakami não conta sua vida toda no livro – apenas o início de sua carreira como escritor e como corredor amador. E, correndo o risco de o texto ficar parecendo propaganda das Facas Ginzu, ainda tem mais. A prosa de Murakami é muita fluida. Lê-lo é uma experiência bastante agradável e longe, muito longe de ser cansativa. Ele conduz o leitor através de seus ‘causos’ e pensamentos com habilidade e o envolve de tal maneira que chegar à última página do livro beira a frustração, já que pesa saber que não há mais o que ler. Ressaca literária define.
“Ser maratonista não é um esporte para qualquer um, assim como escrever romances não é trabalho para qualquer um. Ninguém nunca recomentou nem desejou que eu virasse um romancista – pelo contrário, houve quem tentasse me dissuadir disso. Ocorreu-me que eu fosse um, e foi isso que fiz. Igualmente, a pessoa não corre porque alguém recomendou. As pessoas basicamente se tornam corredores porque essa é sua propensão.”
(pag.39)
Momento “calorzinho no peito”: em 2012, escrevi este post. Não nego a satisfação sentida ao ver que um ator reconhecido e pelo qual já nutro alguma admiração escreveu um livro relecionando corrida e escrita, assim como fiz no meu texto.
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Bom saber que alguém leu e que vale a pena. Também sinto a vontade de ler 1Q84 mas o tamanho e a fila de livros na lista dá aquela tristeza. Vou aproveitar pra ler Do que eu falo quando eu falo de corrida pra acabar com a coceira de ler o qq Murakami escreve.
Olá Pedro,
Que bom a resenha foi útil. Recomendo a leitura sim. Sendo corredor, ou não, é uma ótima oportunidade de conhecer o Murakami corredor e ter um gostinho do Murakami escritor.
Gostinho de “quero mais” 🙂
Abraços e boas leituras.