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O código élfico
Leonel Caldela

Numa pequena cidade chamada Santo Ossário, vive Nicole, uma jovem vítima das mais improváveis lendas urbanas, com um passado misterioso envolvendo assassinatos e rituais a uma deusa oculta. Em Arcádia, um mundo habitado por elfos, vive Astarte, que diariamente treina arquearia e disciplina élfica, até o dia em que descobre a que é destinado: escravizar os humanos a mando da deusa Rainha, sua mãe.
A cidade é o grande portal que une os dois mundos. Mas Astarte rebela-se contra os elfos e une-se a Nicole contra o mal da Rainha e seus seguidores. Um encontro explosivo que provará que qualquer um pode ser um guerreiro e lutar por aqueles que ama.
(sinopse oficial – http://www.casadapalavra.com.br)

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Apesar da curiosidade sobre este autor gaúcho, bem falado no círculo literário dentre essa “nova geração” de autores – Marcelo Amaral, Luis Eduardo Matta, Raphael Draccon, entre outros – não tinha me animado a ler um de seus livros. Explico-me. Além de fazerem parte de uma coleção – e, atualmente, de séries já me bastam as Crônicas de gelo e fogo (George R. R. Martin) e a Trilogia do Graal (Bernard Cornwell), ambas cuja leitura não terminei -, versam sobre algo que nunca me atraiu muito: o universo dos jogos de RPG. Eis que, num domingo preguiçoso, passeando pela Livraria Cultura, depois de procurar, sem sucesso, por dois livros que eu tencionava adquirir, deparei com O código élfico numa das prateleiras da Geek. E, já que eu estava decidida a não voltar para casa de mãos vazias, comprei-o – não sem antes ler os primeiros parágrafos e perceber que o estilo de escrita me agradava.

O livro poderia ser simplesmente apenas mais um romance nos moldes de novelas da Globo ou Crepúsculo. Tem a estrutura básica de todo romance (e quando digo ‘romance’, não me refiro ao gênero literário): duas pessoas bastante diferentes, que a princípio não se dão muito bem, vão descobrindo sentimentos um pelo outro e são impedidos de ficar juntos por um ou mais fatores externos. E a estória vai seguindo o fluxo conflito/resolução de conflito/aproximação do casal por diversas vezes até que o “felizes para sempre” chegue. Acontece que, neste livro de Caldela, o romance é apenas o fio condutor que leva o leitor até o final do livro. O “recheio”, o entorno, toda a ambientação criada pelo autor é o que realmente faz a leitura valer a pena. Pois há uma gama extensa de elementos que combinados – algumas vezes de modo incomum – resultam num universo engenhosamente construído, rico e muito interessante. A mistura inclui serial killers, lendas urbanas, violência, terror, ação, muitas referências pop, inclusive a super-heróis, e, lógico, lendas élficas.

o código élfico - autor
Leonel Caldela autografando o meu exemplar
E justamente este último elemento era o que mais me deixava apreensiva ao iniciar a leitura. Temia que ou a mitologia élfica fosse desvirtuada, a exemplo do que que aconteceu com os vampiros na coleção de Stephenie Meyer. Ou então que a estória toda se passasse naquele mundo idílico e poético a que Tolkien nos apresentou. Para meu alívio, nenhum dos meus temores se confirmou. Caldela conseguiu juntar os dois mundos, ou realidades paralelas – o mundo élfico, onde vive Astarte, e o mundo real, onde está Nicole – de forma bastante fluida. Aliás, tão fluida, que a intersecção entre eles, além de parecer verossímil, ainda explica vários eventos inexplicados no mundo do lado de cá. Ou melhor, alguns X-Files (a citação foi inevitável) passam a ter uma explicação plausível levando-se em conta a existência do mundo élfico. E essa sacada – entre outras – foi algo que me conquistou durante toda a leitura.

Partiu um pedaço de uma barra de chocolate. O elfo meteu-o na boca e ficou paralisado pelo gosto cáustico, acachapante.
– Se você entender chocolate, entenderá a humanidade – proferiu a garota. – É gordo, cercado de propaganda, doce demais. Faz mal e domina tudo que toca. Mas qualquer um que não goste de chocolate é indigno de confiança.
Astarte comeu o resto da barra.
(p.220)

Um parênteses aqui: das inúmeras referências encontradas na estória, uma das que foi melhor “introduzida” no contexto foi a feita à trilogia O Senhor dos Anéis. Não vou entrar em detalhes, pois spoilers são desnecessários. Mas admito que foi um dos muitos momentos da leitura em que exclamei em voz alta: “PQP!! Que sacada!”.

Apesar de a estrutura do texto passar longe de qualquer coisa que lembre Dan Brown – com seus capítulos super curtos e suas inúmeras interrupções na trama – , a narrativa de Caldela consegue o mesmo resultado, com cenas mais longas e bem elaboradas, diálogos concisos e alternância sem exagero entre os mundos visitados a cada capítulo. Não uma vez, nem duas, mas várias vezes torcia para que demorasse a chegar à estação de metrô em que deveria descer para não precisar interromper a leitura. Algumas vezes, até, aventei a possibilidade de descer uma ou duas estações adiante e depois retornar. E o autor consegue esse efeito sem ter de recorrer a cliffhangers a cada final de cena e nem ao corte de cenas em momentos críticos. A estruturação está presente, não há dúvida. Mas Caldela a trabalha a seu modo, sempre minucioso e preciso, sem excessos. Seu texto conduz e envolve o leitor de forma progressiva. E aquela sensação de “não posso sair desta estória agora” é uma constante durante a leitura.

autografo no livroOutra característica que agrada bastante é que o autor não “entrega” tudo ao leitor. Eu, particularmente, detesto que tudo seja entregue mastigado. E Caldela não faz isso. Ele deixa espaço para o leitor completar os vazios deixados por ele. Não subestimar a inteligência do leitor, mesmo que para a maioria isso não seja perceptível, é um dos fatores responsáveis pelo prazer da leitura. Permitir que o leitor ligue os pontos, descubra o significado das pistas espalhadas pelo texto e consiga por si só compreender o todo é algo que não tem preço. Eventualmente, deixar algo sem explicação – “é porque tem de ser assim” – também é válido, desde que encaixado na trama. Em certo momento, a algo que remete à Força, de Star Wars. E funciona, porque não é destrinchado. Não vem um personagem, do nada, e fala “São midiclorians!”. O mistério também é necessário. Senão, não seria verossímil. Afinal, nem tudo na vida tem explicação (ainda).

Eu poderia comentar sobre a construção dos personagens, sobre os cenários, sobre as cenas de luta, sobre o clímax, sobre o final da estória. Salvo um ou outro detalhe, não tenho ressalvas a fazer a respeito de nenhum deles. Mas acho que já escrevi demais. Provavelmente, a maioria dos leitores não chegou até aqui. E, se chegou, quer mais é que o texto termine logo para poder desligar o computador e ir ler o livro. 🙂

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Cristine Tellier
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