featured-img_playern1

Jogador nº1
Ernest Cline

A história se passa daqui a uns 20 anos. Em um futuro não tão limpo, aprazível e bem organizado como alguns autores de ficção científica do século passado imaginaram. O mundo está mais para a realidade distópica pós-apocalíptica bem ao estilo Mad Max, tomado por guerras, desemprego e fome. A válvula de espape dessa realidade miserável é o OASIS – uma plataforma de realidade virtual global que permite ao usuário ser o que quiser, ou seja, um Second Life que deu certo. As pessoas estudam, trabalham, jogam, viajam, se relacionam dentro do OASIS.

O bilionário recluso, Halliday, criador do OASIS, morre sem deixar herdeiros. Fazendo as vezes de um testamento, ele deixa um vídeo explicando que escondeu um easter-egg dentro do OASIS e quem conseguir achá-lo herdará todos os seus bens. Para chegar ao “ovo”, é necessário encontrar 3 chaves e atravessar 3 portais. O protagonista é Wade (Parzival, no OASIS), o rapazinho pobre, sem recursos, sem família, mas com muita boa vontade, que encontra a primeira chave 5 anos depois do falecimento de Halliday.

jogador n1

Contada assim, a trama parece um daqueles filmes da Sessão da Tarde em que “uma turminha do barulho vai viver altas aventuras”. E não deixa de ser isso mesmo, principalmente porque o livro todo é uma ode aos anos 80 – o auge dos filmes nesse estilo – já que Halliday era fã de tudo relacionado a essa época. Por conta disso, todas as pistas, dicas, obstáculos referentes à caça ao ovo remetem a ela.

A narrativa não é inovadora. O protagonista segue a jornada do herói e o estilo de escrita de Cline não tem nada de experimental. Mas fica evidente que essa não é a intenção do autor. Como também não é sua intenção questionar as ações que levaram o mundo a estar como está, nem listar vantagens e desvantagens de viver no munto real ou virtual, nem questionar o domínio e o alcance das grandes corporações, nem mesmo explorar a complexidade (ou não) dos relacionamentos interpessoais dos personagens. Porém, mesmo não discutindo essas questões no texto, o leitor é levado a parar e pensar sobre elas.

Nitidamente, o foco do livro é outro. Tem um público-alvo muito específico, o que não quer dizer que seja pequeno: nerds e geeks em geral, gamers, cinéfilos, mas especialmente quem passou infância e adolescência nos anos 80. O livro de Cline não é um daqueles com algumas referências usadas para agregar valor à narrativa. O texto é um acumulado de referências a filmes, séries de tv, games e até músicas da época. Uma viagem no tempo sem a Tardis. É esse o grande atrativo e a grande diversão. E, por conseguinte, o grande trunfo de Cline. Ultraman é citado, e a gente logo lembra de quando assistiu e qual era o episódio predileto. Comentam sobre War games, e pensamos como foi a primeira vez que assistimos ao filme. Citam uma música do Oingo Boingo e ela fica grudada na cabeça, tocando em loop. Falam de Pac-man e nos lembramos de quantas horas passamos jogando. Com o leitor sendo bombardeado de referências e, por que não dizer, lembranças a cada frase, o envolvimento com a história é praticamente inevitável. O leitor fica imerso no universo do livro assim como os personagens estão imersos no OASIS.

ernest-cline
O autor.
Sim, Cline é um nerd de carteirinha. E, sim, ele é dono de um DeLorean.

Nâo é um livro para todos os leitores. Mas seria ingenuidade afirmar que aqueles que não fazem parte do público-alvo também irão curtir e se deliciar com a obra, porque não vão – há sempre exceções, lógico. Mesmo para o leitor “iniciado”, algumas pistas passam batido simplesmente por não se conhecer a referência. E, para o leitor não-americano, há a dificuldade de não ter tido acesso a alguma série de tv ou game que tenha ficado restrito aos EUA.

Nas mãos de um autor um pouco mais experiente – este é o primeiro livro de Cline – algumas falhas estruturais provavelmente seriam sanadas. Pelo estilo da narrativa, a linguagem utilizada, a faixa etária dos personagens principais, a jornada pouco complexa, infere-se que é um livro infanto-juvenil. No entanto, o público infanto-juvenil não tem a bagagem cultural necessária, ou seja, a vivência dos anos 80, para desfrutar da viagem adequadamente. E o público adulto, que tem essa bagagem, talvez ache as soluções narrativas um tanto preguiçosas em alguns momentos – coincidências demais atrapalham. Por exemplo, Wade precisa de um item específico em uma fase do game? O item está em seu inventário e a explicação é que ele o ganhou outro dia ao derrotar um dragão. Wade está com o inventário vazio e precisa ir a um lugar alto, sem acesso? Um de seus amigos possui um par de botas propulsoras, lógico! E assim em sucessivas situações. Se o leitor abstrair isso, a diversão é garantida.

Se há um ponto negativo e que, em muitos momentos, atrapalha a fluidez da leitura é a tradução. O leitor é um nerd/geek que sabe o que é uma sidequest, um MMORPG e obviamente sabe que o terceiro filme de Star Wars é O retorno do Jedi. Desnecessário ficar explicando ou, pior, traduzindo literalmente. Percebe-se que quem traduziu entende pouco ou quase nada do mundo geek/nerd. E, sendo esse o caso, a editora deveria ter passado a revisão da tradução para alguém que entende . Aliás, a revisão também deixa muito a desejar. Há coisas do tipo “navios” em vez de “naves”, espaços faltando entre palavras, erros de ortografia, sem contar um imperdoável “fortaleza impregnável”.

Para quem faz parte do público-alvo e quer ler o livro antes do lançamento do filme, é uma ótima pedida. Os demais, podem experimentar e, quem sabe, curtir também.

[cotacao coffee=”capuccino”]

[compre link=”http://amzn.to/2wBdpUz” bookstore=”amazon”]


Trailer do filme:


Cristine Tellier
Últimos posts por Cristine Tellier (exibir todos)
Send to Kindle

One Reply to “Jogador nº 1, de Ernest Cline”

  1. Eu gosto muito da obra do Ernest Cline. Tanto Armada quanto Jogador n1 são excelentes. Eu adoro ficção! Sua historia é das mais interessantes que tem e algo que eu gosto muito são as adaptações dos livros.Já conhecia o livro, eu li faz muito tempo e é um dos meus preferidos. Gostei muito do filme e achei genial, cheio de boas referências. Jogador n1 é muito divertido! Já tinha visto algumas boas críticas, mas o vi recentemente e realmente me surpreendeu, como um dos novos filmes de aventura que já vi já que nos prende a respiração do início ao final e com belos efeitos especiais. Foi uma grande surpresa de animação. É um filme excelente. Maravilhoso trabalho do Spielberg!!! Assisti 2 vezes no cinema

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *