Spotlight
The Boston Globe
A obra homônima ao filme, Spotlight, diferente do que se poderia acreditar, não é a narrativa que espelha a película, mas sim, o resultado do material investigativo, publicado pela equipe do jornal The Boston Globe, no ano de 2002.
A introdução traz um breve prefácio, deixando claro do que se trata. E deixa pairando no ar uma pergunta de extrema relevância, sobretudo neste tempo de opiniões superficiais: qual a importância do bom e velho jornalismo investigativo?
A meu ver, não poderia haver maneira mais harmônica de dar início ao texto, visto que, no decorrer de seu conteúdo, até o encerramento, o livro dá, inúmeras vezes, a resposta para essa pergunta.
O cerne de sua análise e da reportagem diz respeito aos inúmeros casos de abuso sexual em que as vítimas foram meninos de idades entre 4 e 13 anos, em sua maioria. O formato adotado para a análise do assunto é bastante eficiente, colocando os fatos, analisando o contexto e as consequências e demonstrando uma grande maturidade jornalística ao não adotar um tom nem irritadiço, nem acusativo ou mesmo tendencioso. Apenas cumpre com o que se espera da imprensa: a reportagem.
É claro que, levando em conta a delicadeza da questão, é impossível, tanto ao leitor quanto ao autor, não tomar partido. Até porque os crimes foram devidamente julgados e os criminosos (ao menos alguns) foram condenados. Logo, não há dúvida quanto às suas culpabilidades, podendo referir-se a eles como tais, sem tom de leviandade.
Acima de tudo, a despeito da demonstração de complacência com as vítimas, o livro denota um posicionamento sóbrio em favor da justiça. O que, naturalmente, o põe contra os padres criminosos e toda a junta do clero que, durante mais de quarenta anos, acobertou os predadores sexuais da igreja e vilipendiou crianças e familiares.
A revolta que desperta no leitor instiga a devorar as páginas, quase como uma novela de suspense, onde você quer ver o vilão ser pego e pagar por seus crimes. Os únicos pormenores são que, primeiro, são muitos vilões – muitos mesmo – e, segundo, a história toda é terrivelmente real.
Precisa-se dizer que, apesar da revolta que nos impele a ler com voracidade, em certa altura a leitura se torna um tanto quanto repetitiva, dada à quantidade grande de casos explorados e do tétrico padrão que seguem os acontecimentos.
O Cafeína Literária tem por princípio não se pronunciar politicamente ou comentar polêmicas, contudo foi impossível não traçar um paralelo com o recente e confuso caso da menina carioca estuprada por, alega-se, trinta homens. Da mesma forma como se vê exposto em redes sociais, a igreja tentou, inúmeras vezes jogar a culpa dos abusos nas vítimas. Pensamento para o qual não há palavra mais adequada do que “burrice”. Ou, quando proveniente de uma entidade que deveria pastorear os espíritos humanos, “criminoso”.
Assim, retornando à pergunta sobre a importância do jornalismo investigativo, Spotlight demonstrou magistralmente o quanto ainda há carência dele. O quão são necessários homens com brios de aço para enfrentar sistemas opressores em prol de uma causa justa e reportar esse tipo de atrocidade ao público.
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