exorcismos amores e uma dose de blues

Exorcismos, amores e uma dose de blues
Eric Novello

Tiago Boanerges é um mago nada convencional. Responsável por exorcizar oníricos fugitivos do mundo dos sonhos, viu o sucesso escorrer pelos dedos ao cometer um erro em uma missão. Demitido, sem amigos e com uma doença misteriosa, descobriu que a sorte é uma amiga traiçoeira e fugaz. Agora, anos depois de recuperar a saúde e transformar a má fama em uma profissão lucrativa, a sorte parece ter se lembrado dele mais uma vez. Uma proposta de seu antigo chefe pode ser a chance que esperava para dar a volta por cima e colocar a vida nos eixos – mas também mergulhar novamente nas armadilhas de um amor que pode lhe custar a vida.
(fonte: goodreads.com)

exorcismos amores e uma dose de blues

Mesmo que o mundo de EABD seja de certa forma uma versão estendida do ambiente do bar que dá nome a talvez seu livro mais conhecido, Neon Azul, não é necessário ter lido os livros anteriores de Novello para entender este. Mas os que leram terão a satisfação de reencontrar a prosa cativante do autor e terão a oportunidade de adentrar uma vez mais o universo urbano criado por ele, sempre com um pé, ou dois, no fantástico. Brincar com a linha tênue que fica entre realidade e fantasia não é algo fácil de ser feito, e o autor consegue fazer o leitor embarcar nesse universo sem duvidar (muito) da “veracidade” dos fatos.

Há talvez algo que incomode alguns leitores, mas que se mostrou uma boa solução narrativa: evitar explicações demais, descrições demais no início do livro. As entidades fantásticas são mencionadas como se o leitor tivesse conhecimento prévio de sua existência. Vampiros, lobisomens, fadas, metamorfos e até mesmo exorcistas já fazem parte do imaginário popular. Mas o que dizer de efrites, salvaxes, lúdicos, primais? É preciso descobrir durante a leitura. E ser mergulhado no Entremudos e em São Paul… opsss Libertà tem o efeito de desnortear o leitor e ao mesmo tempo atiçar sua curiosidade. Curiosidade que o impele a continuar a leitura – ao menos até que se forme uma ideia minimamente compreensível do que é cada coisa. Para os que não curtirem essa falta de informação inicial, Novello foi bonzinho e incluiu um pequeno dicionário ao final do livro.

boanerges
ilustração: Carola Vigna
A narração é em terceira pessoa, mas nem por isso o narrador é onisciente, pois são os passos e os pensamentos de Boanerges que acompanhamos durante a leitura. Mais um motivo para não haver explicações demais no início. Afinal, um exorcista está totalmente familiarizado com as criaturas fantásticas que vivem em Libertá. Contudo, nas excursões ao Entremundos, é através dos olhos da protegida de Boanarges, Julia, uma exorcista aprendiz por assim dizer. Além disso, se Libertà é uma metrópole, carecendo de descrições muito minuciosas (principalmente para leitores paulistanos), o Entremundos só consegue ganhar contornos mais definidos se forem dados mais detalhes sobre sua aparência. Em alguns momentos, diminui a fluidez da leitura, mas não chega a ser um problema.

“É verdade que o Entremundos une características de todos os reflexos conectados a ele?”

“É o que os visitantes dizem. Eu nunca me afastei dos pontos de conexão com Libertà para saber”, respondeu Tiago. “O importante a se ter em mente é: depois do espelho, nossas leis não valem de nada. Então temos de ficar atentos.”

Vale destacar a quantidade de referências a outras obras de fantasia, principalmente Alice no país das maravilhas e Alice através do espelho. É delicioso ir identificando versões “bizarras” de personagens como o Chapeleiro Louco, a Lebre de Março, o Gato de Cheshire, a Lagarta Azul, até mesmo as rosas vermelhas do jardim da Rainha de Copas. Quem conhece o autor um pouco mais de perto, deve achar familiares os nomes de alguns personagens também. Mas a melhor parte é o retorno do Marafo, um boneco com cara de diabrete que mora – ou permanece preso – em uma garrafa.
(Eric, queremos mascotes colecionáveis! 🙂 )

Amantes de filmes e de literatura noir devem se deliciar com a leitura. Todos os elementos estão ali: caras durões e de raciocínio rápido (não exatamente príncipes encantados), muitos crimes, muitos suspeitos, pistas inconclusivas, falsas suspeitas, momentos de ação quase alucinante, autoridades corruptas e, não poderia faltar, a femme fatale. O clima da narrativa é tão característico desse gênero que é quase possível perceber nuvens encobrindo a cidade todo o tempo ou visualizar Boanerges como um Sam Spade “sobrenatural”, faltando apenas o chapéu fedora e o cigarro no canto da boca.

E complementando o clima noir, blues, muito blues. “Blues all over the place”. O leitor que ficar com vontade de montar uma playlist com as músicas que aparecem na história não precisa fazê-lo. A playlist já está pronta no Spotify. Testada e aprovada, simplesmente ótima para acompanhar a leitura.

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Cristine Tellier
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